Era um vez Dostoiévski.
Era um vez Dostoiévski. Um menino que queria ser poeta mas foi obrigado a ser engenheiro pelo pai. Ingressou na faculdade de engenharia mas perdeu os pais logo em seguida. Sozinho e desamparado, se lançou na escrita para poder se sustentar. Mal sabia ele que sustentaria também no futuro toda a base de uma literatura mundial.
A publicação do seu primeiro livro já dá o que falar e o moço Dosto começa a frequentar círculos de debates literários na companhia de jovens revolucionários. Numa noite de discussões acaloradas, deu azar. Foi levado como preso político.
De pés descalços e mãos atadas, Dostoiévski encara o pelotão de fuzilamento. É o fim. Vai morrer sem nunca ter escrito sua obra prima. Sorte a nossa que o Tsar só queria “dar uma lição” nos jovens. Os soldados apontam as armas - mas não disparam. Era tudo só uma simulação do Tsar zoeiro. O castigo verdadeiro era muito pior - prisão e trabalhos forçados na Sibéria.
Ironicamente, é daí que Dostoiévski tira material para escrever uma de suas primeiras obras primas, “Humilhados e Ofendidos”. Trabalhando acorrentado, em meio a percevejos e baratas, enxerga “o copo meio cheio”:
”Quantos tipos populares e personagens trago eu da galé! Convivi com eles, por isso acredito que os conheço bastante bem. Quantas histórias de vagabundos, de bandidos, e, em geral, de desolação e perfídia diárias! Material para preencher livros inteiros. Quantas pessoas incríveis! De modo geral, não perdi meu tempo. Aprendi a conhecer bem, se não a Rússia, ao menos o povo russo, talvez como poucos.”
De fato, preencheu livros inteiros. Em “Humilhados e Ofendidos”, primo distante de “Os miseráveis”, Dostoiévski constrói personagens verdadeiros porque são reais. Ele tinha o dom de criar na arte a substância da própria vida, o sofrimento que observou de perto, as histórias que ouviu atento. Li em algum lugar que a gente não lê Dostoiévski pra conhecer a história do livro, a gente lê Dostoiévski pra se sentir humano.
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